Leite-creme, um modo de o ver
Há muito que não havia uma sobremesa neste blogue, e pensei em leite-creme, porque andava a matutar numa sobremesa que pudesse levar espuma, e, no caso de leite-creme, seria espuma de açúcar queimado, uma coisa simples. Desmontava assim o doce tradicional, ou descontruía-o, como agora também se diz para este tipo de cozinha. Mas se a espuma dava o sabor do açúcar queimado ao doce, não lhe dava a textura crocante. Essa, fui buscá-la ao adereço de massa brick com grãos de pólen. Fora do contexto da minha interpretação do leite-creme estava o copo de shot com granizado de menta. No entanto, teve duas funções: uma foi aligeirar a doçura da sobremesa, com a frescura quer da menta, quer do granizado; outra foi quebrar o tom geral da cor.
O que usei:
Leite-creme
5 gemas grandes
60 g de açúcar
20 gr de farinha de trigo T55
500 ml de leite
Noz moscada q.b.
Separei as gemas, bati-as um pouco, juntei noz moscada, imaginando que ficaria bem, como na verdade ficou, juntei o açúcar, mexi, e depois adicionei a farinha em chuva, e bati bem com a colher. Juntei um pouco do leite, misturei com a vara de arames, e depois deitei o resto do leite, tornando, a misturar. Provei para ver do sabor a noz-moscada e moí um pouco mais dela. Levei o preparado a lume primeiro forte, mexendo sempre, depois pu-lo no mínimo, continuando a mexer, agora a espaços frequentes, até espessar, mas sem deixar ferver. Passei para uma travessa para que arrefecesse.
Espuma:
½ frasco de caramelo industrial, cerca de 100 ml.
50 ml de brandi
Água a perfazer 250 ml
3 g de lecitina de soja
A espuma é sempre a última coisa a fazer. Também não a quis apenas a saber a caramelo de pudim, e entre as duas hipóteses que me vieram à cabeça, canela ou um álcool, escolhi conhaque. Bati o líquido então como aqui se fez e, embora a espuma se mantivesse, estava um pouco mais débil que a de laranja. Donde cheguei à conclusão que podia levar mais lecitina de soja que os 12 g/ l. Fica este apontamento para mim e para quem me leia.
Adereço crocante:
Massa brik
Manteiga q.b.
Grãos de pólen q.b.
Cortei com a tesoura triângulos de massa brik, untei uma assadeira com manteiga derretida, colei nela a massa, pincelei a face de cima dos triângulos, que estava seca, com a mesma manteiga, e espalhei nela grãos de pólen, calcando-os ligeiramente, para, depois da cozedura, ficarem colados à massa.
Granizado
Xarope de menta para refrescos -1 parte
Água – 4 partes
Misturei o xarope com a água e levei ao congelador. Fui vigiando e mexendo de vez em quando, para que não ficasse em gelo.
As ligações e os sabores das várias partes entre si funcionaram como se previa, e saiu uma sobremesa que não deixaria de me surpreender se a saboreasse num restaurante. Assim, limitei-me a ficar contente popr não ter trabalhado em vão e por ter conseguido dar ao leite-creme uma cara nova, com base nos seus sabores e texturas tradicionais.
Etiquetas: Criações - Sobremesas
15 Comments:
Olá.
Desculpe a 'invasão'.
Gostaria de saber se você conhece ou já ouviu falar de Bottarga.
Agradeço desde já.
Essa da noz moscada no leite creme eu vou ter de experimentar, até já estou a saborear!...
Descontruir o prato, nunca tinha pensado nisso, (pausa) já estou a imaginar as 1001 descontruções que posso fazer.
Estou a adorar vir aqui, mais do que ideias os seus "ensaios" são inspiradores, quase filosóficos.
Beijocas
Quanta inspiração! Está de parabéns pelo ensaio! Gostei muito.
Bela sobremesa. Agora, pra se fazer uma bela espuma me parece que sem fazer um teste você não obtem grandes resultados. Será que a quantidade de lecitina depende dos ingredientes que se está utilizando ?
Fiz mais uma experiência com agar agar ontem e mais um desastre! Acho que estou me transformando num cientista maluco !
Sem dúvidas!
Que restaurante!
Muito original a apresentação do seu leite-creme!
Adoro leite creme, parabéns pela apresentação, como diz o provérbio os olhos são os primeiros a comer!!
Maria
Club, são ovas de peixe secas, quanto saiba, comem-nas em Itália e em França, e creio que já as vi em Portugal numa casa de produtos gourmet, mas creio que estará no Brasil, donde a distância destas ovas permanece.
Marizé, pensava que o sabor da noz moscada no leite-creme sairia mais acentuado. Não foi mal, mas com cravinho acho que irá a matar :)
Quanto à desconstrução de comida, Jaques Derrida já não pode ouvir-nos, senão era o diabo...
Sementa de Sésamo, creia que na base destas coisas está a minha grande preguiça em cozinhar de novo por livros e receitas, mas sempre tenho de recorrer a eles, o leite-creme, por exemplo, foi adaptado do livro de Bento da Maia, e é muitíssimo bom. Se as gemas forem médias aplique as 6 que lá diz. As minhas eram bem grandes. Na verdade, as receitas deviam ser todas por pesos e volumes, quanto a ovos e não só.
Eduardo Luz, a espuma esteve a contento, mas não tão macia nem tão firme como a anterior, de sumo de laranja. Daí eu ter posto essa questão no próprio post. Claro que temos de fazer experiências. Muito possivelmente, estou quase certo, este líquido exigirá mais lecitina.
Talvez amanhã, que é feriado, pegue no agar-agar, logo se verá.
Caiano Silvestre, deite mãos à obra, substitua o açúcar por adoçante e vai ver que o leite-creme fica tão bom como o do restaurante :)
Trocava este prato de sobremesa por dois belos pãezinhos dos seus. Até me fizeram crescer água na boca!
Os olhos são mesmo danados, Anónimo, pecam bem mais depressa que a boca :)
Isso é que é imaginação. Parabéns. Deve ter ficado deliciosa! Leite creme, bem feito, é uma coisa muito boa, mas dessa maneira...
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