A culpa não foi do bacalhau à Brás
Este bacalhau à Brás deixou-me bastante arreliado. Não o prato em si, cujo modo de fazer fui buscar a O Livro de Pantagruel, receita n.º 743, pág. 179, volume I, 31.ª edição, mais um livro que deu aos portugueses muitos pratos tornados de família. É um livro de receitas honesto e fiável. Servi-me dele com receio de que o meu modo de confeccionar este bacalhau (a olho) desse bronca e me enchesse de trabalho.

Afinal o trabalho veio à mesma, porque não era o vulgar bacalhau à Brás que eu queria, mas o que saboreei num menu de degustação do Restaurante Casa Cástulo, em Galaroza, uma excelente cozinha criativa num lugar perdido e belo das terras andaluzas da D.O. Jabugo, a 50 km da fronteira de Elvas. Tratava-se de uma montagem em cilindro de bacalhau à Brás (sem salsa), macio e untuoso como é devido, encimado por um ovo na justa medida da face superior, impecável, feito na chapa, cuja gema, uma vez rompida, o tornou muito mais macio e untuoso do que já era, para grande surpresa minha. Foi isso que me propus fazer.

Limite de Galaroza (estudo), Seraphina Mosey, pastel, 1999.
Ora a causa da arrelia foi precisamente o ovo no topo, digamos a grande cereja amarga no cimo do bolo. Qui-lo escalfado, o que faço sempre com todos os quesitos, água quase sem ferver numa sertã, com 10% de vinagre de 6º de acidez, primeiro a
O bacalhau, estava bom quando o provei do tacho, embora prefira o que faço, tão macio como este e mais saboroso. A diferença está em que estufo o bacalhau na cebola finíssima já cozida no azeite e ponho então o alho picado, além de mexer os ovos à parte, deixando-os cremosos e misturando-os no fim. O Pantagruel manda fritar, em separado, primeiro o alho no azeite, depois a batata palha, a seguir a cebola, e só então o bacalhau, reservando cada um destes elementos, e só no fim os juntando no tacho com os ovos em cru, batidos, o que obviamente o torna menos apurado. Não se tratava, porém, de fazer um bacalhau à Brás, mas sim de repetir o segundo ou terceiro prato daquele excelente menu de degustação. No final já nem me soube a nada.
Etiquetas: Fiascos
6 Comments:
Acho que já o tinha dito, mas repito: gosto muito da forma como escreve :)
A Paula tem razão: eu tb gosto da forma como escreve. É aliás uma coisa engraçada:quando o assunto é culinária, os homens têm uma forma de escrever completamente diferente das mulheres!
a forma como escreve até faz engordar. você é uma delícia a escrever. parabéns.
Paula, Goretti, João Barbosa, fico sem jeito, sem saber onde meter as mãos. No entanto, confesso que para mim a nossa Língua é uma paixão e, como escreveu Fernando Pessoa, a minha pátria. Fico feliz por isso. Como costumo dizer, ninguém escreve para não ser lido.
Aprender, sempre.
(Bom fim-de-semana)
É preciso ter cuidado com estes bacalhaus, com coisas cruas, só se deviam aventurar nestas coisas com suficiente conhecimento dos classicos e da higiene e do método. E já agora não mexam na comida com as mãos. Ob.
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