Bola de carne de vinha d'alhos
Inspirei-me na bola que se come numa padaria mais que pastelaria deste velho burgo que já teve um bispo suevo - vejam lá a infinidade de gente que por aqui passou sem deixar rasto das suas vidas. Mas não se amofinem com o que digo. Estar vivo é, além de muitíssimo mais, poder fazer bolas de carne e comê-las. Claro que me rio com estes disparates e por isso os escrevo. Um blogue de comer e beber deve ser dedicado a Epicuro, depois de ter sido benzido por Dionísio, que não gostava apenas da mesa como sabemos, gostava da vida, e por isso foi vítima dos novos fundamentalistas religiosos da época, que o "mataram" e - diz Plutarco, historiador da época greco-romana, referindo-se a Pã, uma espécie de Baco de segunda linha - encheram o mar da ilha de Palodes de gritos e lamentos pela sua morte.
Não vejo como fugir destes prólogos. Enfim, como nesta cidade já se comia pão-de-ló com sardinha salgada no tempo do volfrâmio, porque pão era coisa pouca para tanta nota, a tal padaria-pastelaria, seguindo a tradição (bem portuguesa) de elevar o bom ao mau, achou por bem aplicar na bola uma massa quase de brioche e pôr apenas na vinha d'alhos chicha pura de porco, sem sombra de gordura. Mesmo assim é boa, diga-se, mas podia ser bem melhor.
Usei carne de porco da pá por ser mais gorda e coiratos do mesmo. 700 g de febra da pá e 300 g de coiratos. E pus, ambos, na seguinte marinada, por 7 dias, no frigorífico:
1,5 dl de vinho bem tinto.
20 g de sal.
20 g de alho às falhas.
10 g de açúcar.
Massa de pimentão , 1 colher de chá.
Pimentão, 1/2 colher de chá.
Um pouco de pimenta preta do moinho.
Os coiratos foram cozidos longamente em água sem sal, até estarem tenríssimos, porque frios têm tendência a endurecer. Deve usar-se a panela de pressão face a tanta demora, coisa de que não me lembrei. Depois partiram-se do tamanho dos pedaços de carne. O caldo foi a reduzir para se obter gelatina, quando o recheio arrefecesse na bola.
Juntei os coiratos à carne e
levei tudo a fritar primeiro (em azeite) e a estufar depois, juntando pequenos goles da marinada e do caldo reduzido dos coiratos. Provei de sal, mas nem era preciso, a quantidade que deitei na vinha d'alhos já estava calculada em função do peso.
Para a massa, usei 500 g de farinha de trigo tipo 55, 300 ml de água, 7 g de sal, 10 g de açúcar e mais ou menos 6 g de levedura, e pus a máquina no programa "amassar e levedar".
No final amassei mais a massa, que sai da máquina pouco amassada, a meu ver. Dividi-a em duas partes: uma, para o fundo da bola, com cerca de dois terços dela; outra, o restante terço, para a fechar.
Estendi a massa com o rolo, fui buscar a fita da costura, medi o tabuleiro e fiz o molde para a parte de baixo, com a massa já estendida, como se fosse um alfaiate. Com a ajuda do rolo, dispus a massa no tabuleiro, e tirei o molde para a parte de cima. Deve prover uma abertura para os vapores do molho sairem. Como não o fiz, saiu-me líquido por um dos lados que não se vê na imagem abaixo.
Levei a bola a cozer com o forno a 180ºC. Dourada, retirei-a e proveia-a no dia seguinte, isto é, comi um bom bocado dela. Ontem. Estava perfeita, com um senão: para a próxima ponho mais molho na bola, nem que tenha de usar uma folha de gelatina. Não sei se estão a imaginar o efeito de prender o molho deste modo: torna a bola mais húmida e untuosa, ainda que já estivesse assim, mas não se perdia nada se estivesse mais.
Com a massa que sobrou fiz uns pãezinhos de que deixo aqui a imagem. São óptimos com manteiga e fiambre. Testei-os com uma cozedura a 250 ºC e ficaram bem melhor que a 180ºC, como da última vez os cozi.
Etiquetas: Recriações - Bolas e pães
5 Comments:
Só de olhar para a fotografia da carne, fiquei com a água a crescer na boca!
Digna de um profissional!
Há sempre o recurso do correio, Goretti ;)
Paula, um profissional da horas vagas, um pintor de domingo :)
ajudem-me: a vinha d'alhos pode-se pôr no frígofifico?
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